Vem Morar Dentro De Mim

É assim que eu chego até você esta noite. Completamente nua. De expectativas, conjecturas, de pré-conceitos e conceitos sobre qualquer coisa que nós já tenhamos vivido.

Não quero dizer velhas frases, nem usar de antigos artifícios. Por que tudo precisa parecer uma equação matemática de Navier-Stokes? Esqueça que sempre será possível complicar o simples, o agora é o único tempo que temos.

Me permita tirar a roupa para você esta noite. Quando eu chegar, abra a porta do apartamento e, franzindo as sobrancelhas, me pergunte por que eu demorei tanto. Não espere pela resposta; me dê um longo beijo na boca, é um bom começo para que eu saiba que você sente a minha falta, e ofereça uma taça de um vinho tinto recém comprado. Mostre-me o rótulo para disfarçar a ansiedade e diga que acha que eu vou gostar, pois não é um vinho doce. Sorrirei, sabendo que você ainda se lembra do que eu disse numa outra noite. Olhe nos meus olhos e tente decifrar o que eu estou pensando quando você diz coisas que não fazem nenhum sentido.

Quem roubou sua coragem?

De todos os nossos desejos não ditos, eu desejo estar completamente nua para que você grave a sua voz, o seu tom de pele, as suas emoções e seus sonhos.

Quero estar nua para que suas retinas espelhem a minha silhueta no asfalto dessa cidade quente, no trânsito parado, nos trilhos do metrô, no desenho dos prédios cada vez mais altos e blindados de qualquer emoção. Não deixe que o medo de cair interrompa a queda, que as possibilidades rabiscadas numa vida de esboço tirem de nós o momento de tornar tudo possível.

Quero estar nua para você antes mesmo que suas mãos alcancem o zíper do meu vestido de seda e, num gesto decidido, o faça deslizar até o chão.

É assim que eu chego até você essa noite. Completamente nua. Vem morar dentro de mim.


Corina Haaiga - Todos os Direitos Reservados

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